CADÊ OS INTELECTUAIS BRASILEIROS?
Em meio à escuridão, quem tem lanterna é rei. Estou muito afim de ouvir a elite. De verdade. Temos que saber mediar o choque de opiniões; elite e periferia em choque podem ser fundamental para nosso crescimento como povo. O problema é que não estou ouvindo ninguém. Só ouço tiro. Quero ouvir opiniões verdadeiras. Quero começar pela elite, cobrar o saber acadêmico que eles historicamente roubaram da maioria. Cadê? Falem alguma coisa útil pelo amor de Deus. Estou cobrando como cidadão em meio ao conflito. A intelectualidade brasileira vive de especulações acadêmicas superficiais. Estão ilhadas num mundo que não interessa à maioria dos brasileiros.
Quem são esses intelectuais brasileiros e qual a função de um intelectual numa sociedade? Estamos muito bem servidos de intelectuais e suas opiniões mercantis. Mas estamos pessimamente servidos em opiniões que realmente nos tragam alguma luz, alguma faísca que acenda nossa consciência, que evoque alguma ação ou que provoque mudanças.
Nos anos 1970 tínhamos várias vozes sendo caladas pelo incômodo que traziam. Glauber Rocha, Zuenir Ventura, Chico Buarque, Caetano, Gil, Fernando Gabeira, Ferreira Gullar, Henfil, Gonzaguinha, Elio Gaspari, José Celso Martinez Correia, etc. Gente que era perseguida, com a opinião certa, no momento em que mais precisávamos ouvi-las, mas fomos impedidos pois eles foram caçados à força. Só os intelectuais reacionários e conservadores tinham transito livre nos jornais e na TV para manifestar opinião, como Nelson Rodrigues, que a dona Globo sempre amou e endeusou. Arnaldo Jabor, um desses pseudo-intelectuais do qual eu falo (e que a Globo também endeusa), numa entrevista recente afirmou, numa arrogância que só o Jabor tem, que tem a facilidade de escrever e falar como o reacionário, embora talentoso Nelson Rodrigues.
Hoje aqueles que realmente emitem opiniões que provocam reflexão verdadeira são calados pela falta de visibilidade, ou seja, a mídia não torna pública opiniões que não tenham o carimbo das empresas midiáticas, os que mercantilizam o pensamento intelectual brasileiro. Hoje os intelectuais que têm esse carimbo estão envoltos em seus mundinhos fashion. Opiniões tão plásticas e superficiais quanto o clima de globalização cultural e econômica que vivemos.
Ninguém sabe onde vive o intelectual brasileiro. Ora ele tá numa praia do Rio de Janeiro, ora em Paris, Nova Iorque, ora em cima de um trio elétrico em Salvador, etc. O intelectual brasileiro adora dar seus “Show-Aulas”, ou “aulas-show” e são bem pagos pelas academias para isso. Quem já esteve presente a um evento desses sabe o que estou falando. O(A) notável chega, começa a teorizar sobre várias questões, em especial a metafísica, e se acovardam diante do “tudo é relativo”.
Esses aí são os reis da retórica, da arte de falar bonito, muitas vezes até cheios de razão numa raivinha artificial ao falar de cultura, da miséria brasileira, da política, de assuntos internacionais, mas que tão logo se apagam os holofotes, já estão sorrindo em seus mundinhos de champagne, carros, buffets, coquetéis de lançamentos, e etc. São os reis da masturbação intelectual, né Jabor?! São mais vaidosos do que úteis. Como dizia Sérgio, o personagem do ótimo filme cubano Memórias do subdesenvolvimento, de Tomás Gutierrrez Alea, cansado da falação intelectual: “...as palavras devoram as palavras e deixa você nas nuvens, longe da ação. A questão é: como sair do subdesenvolvimento?”
A principal audiência dessas “celebridades” da inteligência brasileira são os universitários. Ao invés de questioná-los, prestam atenção boquiabertos, eufóricos e empolgados, a cada frase de efeito desses reis da retórica. Exibem seu notável saber aprendido nas universidades e nas rodinhas de amigos dos cafés Parisienses. A platéia delira e todos concordam com todos. Quando alguém aparece pra questionar o que está sendo dito já é visto como inconveniente.
É preciso que entendamos como funciona a “indústria” do pensamento intelectual brasileiro. Por trás do acovardamento dos intelectuais, o “Tudo é relativo” reina e qualquer bom argumento é bem pago pelos canais da mídia. Esses intelectuais vivem de palestra, ganham seus salários de bolsas e de cargos no governo além de seus afazeres artísticos. Outros são muuuuito bem pagos por grandes canais de comunicação para emitirem suas opiniões ridículas, elitistas e conservadoras envoltas num discurso jovem, artificialmente enfurecido e despojado, né Jabor?! É fácil ser leão em meio às ovelhas.
Enquanto os bravos intelectuais de ontem se calam e parecem ter perdido o rumo com o esfarelamento do ideal de utopia, ninguém dá espaço merecido aos verdadeiros intelectuais brasileiros, aqueles que vivem o dia-a-dia do que falam, que não estão ilhados em suas redomas afastados da maioria. Gente como o poeta da periferia Sérgio Vaz, que organiza o Sarau da Cooperifa na Zona Sul de São Paulo; gente como Erton Moraes, criador do movimento literário Trokaoslixo; sem contar que nunca deram espaços devidos a dois grandes pensadores brasileiros, todos dois recém falecidos: Milton Santos e Clóvis Moura, este último, autor do belíssimo livro sociológico “Rebelião da Senzala”, de 1960, morreu na mais completa miséria, devendo tudo e a todos para poder pagar os custos com sua saúde.
Portanto Caetano, Jabor, Diegues, pra citar aqui os mais famosos, antes de aparecerem em espaços reservados às suas opiniões bem articuladas, cheias de saber porém ridículas e inúteis... antes de chamarem bravas mulheres e mães de família de vagabundas em horário nobre, sr. Jabor, procure refletir um pouco e saia dessa redoma regada a whisky, tapinhas nas costas e holofotes que você tem. A periferia ignora tudo que você fala. Não interessa. Faça seus showzinhos para essa elite branca e colonizada da qual você faz parte e vamos celebrar a alegoria da nossa miséria. Quando o bicho pega é que a gente vê quem é quem e de que lado você fica.
Déo Cardoso: 29 anos, Cineasta, escritor e amante do hip-hop. Contato: deocee@hotmail.com |
1 comment:
Eis ai, um verdadeiro brasileiro, esse sim, merece aplausos! Não uma cambada de intelectuais colonizados mentalmente, espúria de uma corja massificadora, que destroem a si mesmo, e a todos!
Também pudera, vivemos uma mentira, onde os nossos heróis são forjados, a nossa história um engôdo, etc.
Parabéns!
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