Nove pastorais sociais e organismos eclesiais divulgaram um manifesto, na sexta-feira, 16.02., criticando a programação do lançamento da Campanha da Fraternidade 2007, na quarta-feira (21.2) na capital paraense.
Eles argumentam que "entre o discurso do texto-base da campanha", que destaca a reflexão e o conhecimento das comunidades tradicionais e da Amazônia, e a forma como está sendo feito o lançamento da campanha "há uma contradição muito grande".
"A organização do lançamento foi entregue a uma empresa de eventos. O lançamento será numa ilha. A participação será restrita aos que tiverem convites. O embarque para a ilha será nas Docas, local reservado para as elites do Pará", afirmam os manifestantes em nota.
Segundo as entidades, "o mais grave" é que o lançamento seja patrocinado pela Companhia Vale do Rio Doce, "que é uma das principais responsáveis pela destruição ambiental e por conflitos com as populações tradicionais da Amazônia".
“A imprensa nacional noticiou nos últimos meses as ações dos índios Xicrin contra a Vale, e como esta cortou todos os repasses de recursos contratados com os indígenas, só voltando a efetuar os mesmos por decisão judicial”, afirmam no manifesto.
O tema deste ano é Fraternidade e Amazônia. Pela primeira vez em 43 edições o lançamento da Campanha da Fraternidade não é realizado em Brasília. A CNBB escolheu a cidade de Belém (PA), porque o Pará, segundo um estudo do IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, é o estado que tem o maior índice de desmatamento.
Segundo o presidente do Conselho Nacional do Laicato do Brasil, Carlos Francisco Signorelli, o lançamento está sendo feito em moldes ostensivos. “O local vai ser fechado para a população. Nós achamos que ele deveria ser feito de uma forma mais eclesial e amazônico”, reclamou.
As entidades não participam do lançamento da campanha de 2007. “Diante disto, decidimos não participar do ato de lançamento, como protesto pela forma como foi organizado, sobretudo pela ausência do povo, o principal sujeito da Campanha da Fraternidade”.
Apesar das críticas, as entidades não são contra a Campanha da Fraternidade, criticam apenas o lançamento. Segundo o manifesto, a campanha é um gesto profético da Igreja no Brasil que ajuda os cristãos e toda a sociedade a refletirem sobre temas da maior relevância social.
Para Signorelli, a Campanha da Fraternidade é fundamental e as entidades contribuem muito para a difusão dela por todo país. “Nós achamos que houve falta de sintonia entre a campanha e a forma de lançamento, pois ela prega que os povos da Amazônia têm muito a dizer pela sua simplicidade”.
Assinam o manifesta a Articulação Nacional da Pastoral da Mulher Marginalizada, a Comissão Dominicana de Justiça e Paz do Brasil, a Comissão Pastoral da Terra, o Conselho Nacional do Laicato do Brasil, o Grito dos Excluídos e Grito dos Excluídos/as Continental, Pastoral da Juventude Rural, a Pastoral do Menor e o Serviço Pastoral dos Migrantes. (Clara Mousinho/ Agência Brasil)
Título original: Entidades católicas divulgam manifesto com críticas ao lançamento da Campanha da Fraternidade
Fonte: Ambiente Brasil, Brasília, DF – 25 02 2007
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CLAMOR PELA VIDA NA AMAZÔNIA
A Igreja no Brasil, por meio da CNBB, irá refletir neste ano na Campanha da Fraternidade o tema Fraternidade e Amazônia com o lema Vida e Missão neste chão. Em tempos de preocupação com o meio ambiente e com o aquecimento global, o tema e o lema da CF 2007 significa um clamor pela vida na Amazônia para toda a humanidade. A Amazônia se torna neste momento um foco de atenções por parte de ambientalistas, religiosos, teólogos, educadores, antropólogos e cientistas em geral que se preocupam com o destino do homem e do planeta. O alerta foi dado recentemente pelos cientistas reunidos em Paris, na França. A Amazônia corre o risco de ser destruída pelas mãos do homem caso não haja uma recriação de uma cultura da vida nas consciências das pessoas.
O objetivo geral da Campanha da Fraternidade de 2007 é “conhecer a realidade em que vivem os povos da Amazônia, sua cultura, seus valores e as agressões que sofrem por causa do atual modelo econômico e cultural, e lançar um chamado à conversão, à solidariedade, a um novo estilo de vida e a um projeto de desenvolvimento à luz dos valores humanos e evangélicos, seguindo a prática de Jesus no cuidado com a vida humana, especialmente a dos mais pobres, e com toda a natureza”. Conhecer significa compreender as representações simbólicas existentes nos povos da Amazônia, povos da floresta, que são as comunidades ribeirinhas, indígenas e seringueiros. Além disso, conhecer para compreender a real e dramática situação do bioma que sofre o risco de desaparecer em alguns anos devido a cultura de morte estimulada pelas mãos do homem na região.
Os objetivos específicos da Campanha da Fraternidade de 2007 segundo fontes da CNBB são:
Ø Promover um conhecimento atualizado e crítico da realidade da Amazônia brasileira, dos seus povos tradicionais e das formações urbanas, no que diz respeito à diversidade de sua história, economia e cultura, superando a desinformação, os preconceitos e as falsas interpretações;
Ø Denunciar situações e ações que agridem a vida, os povos e o ambiente da Amazônia, como os projetos de dominação político-econômica que perpetuam modelos econômicos colonialistas;
Ø Apoiar e fortalecer iniciativas corajosas de denúncia das causas da violência e de seus responsáveis, que já fizeram correr tanto sangue no chão da Amazônia;
Ø Promover a solidariedade e a partilha de experiências, saberes, valores e bens, na construção e difusão de alternativas de convivência diante do modelo consumista neoliberal, contribuindo para o fortalecimento da identidade, da autonomia e da soberania dos povos e das comunidades da Amazônia;
Ø Estimular a mudança de mentalidade que se expresse num estilo de vida simples e austero, respeitoso do ambiente e do próximo;
Ø Apoiar e fortalecer a presença e a ação evangelizadora da igreja na Amazônia, bem como suas iniciativas missionárias e de solidariedade social;
Ø Incentivar a participação e o controle da sociedade civil, com critérios de gestão socioambiental, na elaboração e implementação das políticas públicas e projetos locais, regionais, nacionais e internacionais, para o desenvolvimento da Amazônia.
Há diferentes formas de leitura sobre o universo amazônico e o mais discutido é o que afirma a Amazônia como Patrimônio da Humanidade. A Amazônia possui 7,01 milhões de km², 20% da reserva mundial de água não congelada, 34% da reserva de floresta mundial e em torno de 1.100 rios. Abrange territorialmente no Brasil os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins, Maranhão e Mato Grosso, ou seja, cerca de 59% do território nacional.
A Amazônia é rica em diversidade de povos, culturas e valores. Podemos destacar como sendo Povos Amazônicos os povos indígenas, as organizações dos povos indígenas nos estados, povos afro-descendentes, migrantes do ciclo da borracha, ribeirinhos, posseiros, colonos e migrantes e também população urbana.
Os desafios da realidade amazônica, a saber: a ocupação da Amazônia, a disputa pelo território, o controle do território e o modelo de desenvolvimento, a internacionalização, a militarização, o narcotráfico e a integração nacional. Destes, a questão mais grave é a do controle do território e o modelo de desenvolvimento com suas conseqüências drásticas para todo o ecossistema como o grande avanço de desmatamento para o Agronegócio e o aumento substancial das queimadas, da mineração, das siderúrgicas e do carvão vegetal e do programa energético e do uso da água. Tais conseqüências precisam sofrer sua superação com a reflexão pautada no controle da biodiversidade, no manejo sustentável da floresta e na preservação que não pode se caracterizar apenas como um ônus. Diante desses desafios da realidade amazônica surgem os desafios sociais que podem ser caracterizados em três eixos, a saber: 1. A natureza rica é a casa das populações pobres; 2. Realidade Urbana e a concentração da pobreza; 3. Uma região que se move.
A CF 2007 quer promover um amplo debate na sociedade sobre a Amazônia numa perspectiva da libertação integral do ser humano que deverá se converter, ou seja, deverá deixar de lado o paradigma da conquista e da morte e assumir o paradigma do cuidado, da vida. Para isso, conclama-se a todos e todas, que participem dessa reflexão e da construção de uma Amazônia popular e solidária. Neste sentido, a CF propõe três dimensões:
Ø Em defesa do direito à Terra – Promover a criação de reservas extrativistas, fortalecer os projetos de assentamentos agroextrativistas (PAEs) e de desenvolvimento florestal sustentável, respeitar as comunidades quilombolas, apoiar a resistência dos posseiros e dos atingidos por barragens e, por fim, formar na perspectiva solidária uma nova cartografia social da Amazônia.
Ø Ações em defesa do direito ao Uso Sustentável – Estimular a preservação e recuperação de lagos e rios, apoiar as quebradeiras de coco babaçu enquanto produtoras de perfume, formar uma grande rede de solidariedade agroecológica da Amazônia, estimular e fortalecer o artesanato como economia local e solidária, promover a formação de trabalhadores e trabalhadoras para a cultura do mel com a criação da apicultura e promover a utilização legal da devastação.
Ø Em defesa do direito a ter direitos – Fortalecer os Fóruns e Conselhos de Articulação, recriar os processos de formação integral e permanente, ampliar a presença e a participação das mulheres, estimular o surgimento de escolas que educam no campo e para o campo, promover uma comunicação alternativa, promover a saúde popular e estimular a economia solidária no mundo urbano.
A Igreja na Amazônia tem mostrado o seu rosto profético na defesa dos rostos excluídos da região. Essa marca produziu muitos mártires, entre eles: Pe. Ezequiel Ramin e Irmã Dorothy Stang. Também se destaca as constantes ameaças de morte sofridas por Dom Erwin Krautler, bispo da Prelazia do Xingu.
A questão da Amazônia agora por meio da CF se torna uma reflexão teológico-pastoral ao proporcionar motivações nas comunidades cristãs do Brasil que são convidadas a pensar a temática abordada, bem como se deixar questionar pelo sopro do Espírito. Para isso, todos e todas são convidados a se abrir para o projeto de Deus para o mundo.
Numa perspectiva teológica, pode-se afirmar que Deus viu que a Amazônia era boa e sua criação tornou-se um grande poema de amor, de cuidado com a humanidade toda. Neste sentido, a Amazônia estabelece uma relação sadia entre o ser humano com a terra. Assim, respeitar a criação de Deus, a Amazônia, significa respeitar o próprio Deus. O ser humano deve continuar a criação de Deus por meio do trabalho que transforma a natureza em cultura, sem escravizar a Amazônia e o próprio ser humano em nome de um desenvolvimento destruidor. Ao invés de escolhermos idolatricamente o deus dinheiro que determina as relações desse projeto desenvolvimentista, devemos escolher o Deus da Vida. Colaborar com a Vida significa colaborarmos com o próprio Deus. Vida que deve ser vivida plenamente pelos povos da floresta e suas culturas.
Assim, a Vida e Missão neste chão simbolizam exatamente o projeto de esperança de Deus para com toda a humanidade. A CF vem anunciar exatamente este plano de Deus promovendo a Boa-Notícia a esta humanidade chamada sempre a se converter para a cultura da vida (cf. Lc 4, 18). O novo jeito de ser Igreja se abre à cultura dos povos da floresta, inculturando-se, como caminho e espaço para a evangelização tendo como desafio maior a responsabilidade eclesial com a vida e esperança de toda biodiversidade existente na Amazônia (Homem e Natureza). A humanidade precisa pensar a Amazônia a partir da Amazônia, com um jeito diferente de ver a Amazônia, com um diferente conceito de território e de Ambiente (homem e natureza), diferentes conceitos de natureza, relações, propriedade e produção.
A sociedade precisa conhecer a Amazônia para amá-la. Para isso, a CNBB propõe que se criem espaços de divulgação sobre a Amazônia, que se estimulem seminários, simpósios, fóruns de debate e estudos, que o MEC, as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação introduzam a Amazônia como tema transversal no currículo e que haja uma maior preocupação com a formação do povo amazônico. Todos e todas, também, são chamados e chamadas a denunciar as agressões à vida e aos povos da Amazônia. Denunciar é uma atitude que complementa o Anúncio e explicita os valores evangélicos que fundamentam o agir profético. E existem muitas atitudes a serem denunciadas, tais como: a questão do modelo de desenvolvimento principalmente em tempos de PAC, a questão da desproteção da Amazônia e a devastação.
Uma das alternativas propostas é o de promover a solidariedade e difundir as alternativas, conhecendo, apoiando e criticando o trabalho das ONGs e Pastorais Sociais, viabilizando a formulação de um projeto específico para a Amazônia, realizando parcerias, produzindo alternativas de energia e participando de iniciativas missionárias. Neste sentido, é preciso estimular ações que levem a uma mudança de mentalidade, a uma mudança de cultura e de paradigma. E, também, aprofundar a fraternidade missionária entre as Igrejas cristãs ao fortalecer as experiências das CEBs.
Talvez a questão mais urgente para que a sociedade possa agir na defesa da vida na e para a Amazônia estaria na participação de todos e todas do controle social das políticas públicas. É hora de reavaliar os projetos de lei acerca do módulo máximo agrário, do trabalho escravo e do aumento de pena para a grilagem. A sociedade deve gritar por mudanças Judiciário diante de sua morosidade e realizar parceria com a Procuradoria Geral da República, o Ministério Público, a OAB e a Secretaria de Direitos Humanos. Contudo, uma ação concreta se faz urgente e necessária, a saber: “Mobilização nacional para a proibição de emissão de liminares nos conflitos com o latifúndio antes que seja julgado o mérito da ação e seja, eventualmente, comprovada a posse legítima e a regularidade do domínio do imóvel”.
Há alguns dias atrás, a atriz Christiane Torloni e os atores Victor Fasano e Juca de Oliveira promoveram uma atitude sensata e de responsabilidade social. Por ocasião da mini-série Amazônia os atores conviveram com a situação dramática da floresta, os desmatamentos, a ampliação do desenvolvimento irresponsável do Agronegócio, o desrespeito com a cultura e os povos da floresta. Com o sentimento de ajudar, os atores lançaram um Manifesto intitulado Amazônia para sempre que espera colher 1 milhão de assinaturas para que seja encaminhado ao Presidente da República e, provavelmente ao Congresso Nacional com o intuito de que o Poder Público decida dar uma Basta aos desmandos na Amazônia. Evidentemente, trata-se de uma atitude louvável dos atores e todos e todas poderão participar assinando o Manifesto pelo Portal – www.amazoniaparasempre.com.br – e ali também poderemos também estar exercendo a atitude evangélica em defesa da vida como sugere a Campanha da Fraternidade de 2007.
A Amazônia clama pela vida. Digamos não à Cultura de Morte denunciando o agronegócio, o hidronegócio, a devastação ecológica, o desrespeito aos povos da floresta e a intolerância contra as culturas amazônicas.
Claudemiro Godoy do Nascimento
Filósofo e Teólogo. Mestre em Educação pela Unicamp. Doutorando em Educação pela UnB. Professor da Universidade Estadual de Goiás – UEG.
E-mail: claugnas@terra.com.br
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