Sunday, April 29, 2007

A herança africana registrada no genoma dos brasileiros

A análise genética da população brasileira revelou dados inéditos sobre a vinda de escravos africanos para o país. Entre as descobertas estão as de que o trecho da África Ocidental, do Senegal à Nigéria, forneceu muito mais escravos do que se pensava e que a herança feminina é mais presente que a masculina nos genes da nossa população.

Até agora a teoria mais aceita era a dos estudiosos americanos do tráfico negreiro no Atlântico Herbert Klein e David Eltis, que estimaram que apenas 10% dos 5 milhões de escravos vindos para o Brasil haviam chegado do Oeste da África. A região Sudeste do continente teria enviado 17% e a Centro-Oeste 73%.

O estudo do material genético compartilhado por brasileiros e africanos revelou que a proporção de escravos oriundos do Oeste pode ter sido até quatro vezes maior que esta previsão.

- Analisamos o material dos brasileiros e comparamos as informações com as dos bancos de dados das regiões da África, estabelecidos pelo estudo de centenas de pessoas - explica Sérgio Pena, da UFMG.

Dos 120 paulistas que classificavam a si mesmos e a seus avós como negros, segundo dados fornecidos pelo IBGE, 40% apresentavam material genético típico do Oeste africano e o restante das regiões Centro-Oeste e Sudeste. A participação do Oeste nos genes dos 94 cariocas analisados é de 31% e nos 107 negros gaúchos é de 18%.

O material analisado foi o DNA mitocondrial, transmitido pelas mães aos filhos, e o cromossomo Y, passado pelos pais. Segundo os estudos, 85% dos negros paulistas têm DNA mitocondrial africano, enquanto 48% tinham cromossomo Y característico da África. No Rio, a proporção é de 90% para 56% e em Porto Alegre, 79% para 36%.

- As mulheres exerceram um encanto especial, de cunho sexual, nos senhores de engenho - explica Maria Cátira, da UFRGS. - Por isso, o preto brasileiro guarda hoje na herança genética uma contribuição maior das mulheres, embora o tráfico de homens tenha sido maior.

O DNA mitocondrial e o cromossomo Y são bons para determinar a composição de uma população porque não se misturam com outros genes e passam inalterados de uma geração a outra. Mas o material tem pouca informação sobre as características físicas de alguém. A pessoa pode ter DNA africano e ser loira de olhos azuis.

Para Maria, a pesquisa também mostra a extensão da mestiçagem no Brasil. Muitos são identificados como negros e têm uma proporção de cromossomos de origem européia majoritárias.

- Este conceito é muito mais profundo do que imaginamos. O mestiço não é só o que aparenta sinais na pele - diz Maria. - O branco pode ter sido descendente de escravos e o negro pode ter vindo de senhores de engenho, por exemplo.

Para os estudiosos, a proporção de negros vindos da África Ocidental é maior em São Paulo porque a decadência da economia açucareira levou ao deslocamento da mão-de-obra escrava para as plantações de café no Estado. A maioria dos escravos do Nordeste vinham do Oeste da África. Já no Rio Grande do Sul, 80% dos escravos vieram do Rio, onde a presença de pessoas vindas da região era menor.

- O estudo também mostra que as migrações internas têm um papel muito mais importante do que pensamos na distribuição dos africanos, sobretudo com o fim do tráfico - conta Maria. (C.G)

Fonte: JB Online, 29.04.2007 - www.jb.com.br

1 comment:

Hadrigues said...
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