Monday, November 27, 2006

Tendler filma o olhar de Milton Santos

Documentário sobre as idéias do geógrafo encerra a mostra competitiva

O cineasta Silvio Tendler não tem pressa: chega a consumir até duas décadas com um filme. Com a mesma paciência, desenvolve projetos simultâneos. Agora retoma a produção de “Santiago de las Americas”, que iniciou em Havana, em 1988, e finaliza “Utopia e barbárie”, documentário sobre 1968. Ele ainda trabalha no lançamento de toda a sua obra em DVD. Mas hoje Tendler estará na primeira exibição aberta de “Encontro com Milton Santos ou o mundo global visto do lado de cá”, que encerra a mostra competitiva do Festival de Brasília.

O documentário aborda a globalização, a cultura da periferia, os movimentos sociais, e enfoca a tecnologia como elemento libertador, pelo olhar de Milton Santos.

Geógrafo morto em 2001, deixando mais de 40 livros, Santos era professor da Universidade Federal da Bahia até 1964, quando se afastou do Brasil, por causa do golpe militar. Ensinou em universidades da Europa, da África, da América do Sul e do Norte. Em 1994, ganhou pelo conjunto do seu trabalho o Prêmio Vautrin Lud, que equivale a um Nobel da geografia.

— Ele foi clarividente em tudo que falou no filme. Afirmou que a gente não estava escutando o mundo muçulmano, previu que eles iriam se manifestar.

Falava da China, que ninguém prestava atenção na época. Mas afirmava que o país vinha construindo um socialismo à sua maneira, que ia virar uma potência. Previa a explosão dos sem-teto, dos sem-terra, sobre os quais naquela época não se comentava tanto.

Para Tendler, o pesquisador foi uma ponte para outra visão do mundo, inclusive da cultura de subúrbio do Rio. O documentário retrata um grupo de cinema de Japeri que usa cabos de vassoura como tripé de suas câmeras. Aborda o hip hop, a imprensa da periferia, as rádios comunitárias e o fotógrafo de uma cidade-satélite de Brasília que trabalha quase sem recursos. Mostra, ainda, uma invasão de moradores de favelas a um shopping center.

— Eu entrevistei Milton pela última vez em 2001, em São Paulo, com um assistente com uma pequena câmera. Quando perguntei o que lhe dava a certeza de que a cultura da periferia representa a renovação, ele apontou para a câmera e disse: “É isso que me dá certeza.

Com poucos recursos, você pode fazer grandes coisas”.

O Globo Online, Caderno B 27.11.2006
www.oglobo.com.br
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