Tuesday, November 21, 2006

Um dia de golpes no preconceito

Juliana Cariello

O Dia da Consciência Negra - quando é lembrada a morte do principal ícone negro brasileiro, Zumbi dos Palmares - reuniu cerca de mil pessoas na Praça Onze, Centro. Apesar da festividade de ontem, os negros não têm muito que comemorar segundo uma pesquisa divulgada em novembro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

De acordo com o estudo, no Rio, os negros ganham apenas 50,5% do salário dos brancos, têm 13, 9% a menos profissionais com carteiras assinadas e freqüentam dois anos a menos a escola.

Ainda assim, as comemorações continuaram com toda a força e se estenderam ao aniversário de 20 anos da estátua de Zumbi, iniciativa do então deputado José Miguel. A lembrança da lei responsável por tornar o racismo crime inafiançável, de autoria do deputado Carlos Alberto Oliveira, também provocou aplausos dos presentes.

A reação foi a mesma depois do discurso do secretário de Estado de Cultura Oswaldo Alves Pereira, o Noca da Portela, que pediu aos negros que não perdessem a esperança de um Brasil mais justo.

- Não é preciso dizer que a desigualdade racial persiste desde a época da escravidão aos dias de hoje, mas, se eu e o Gilberto Gil ocupamos a secretaria e o ministério da cultura, é sinal de que o negro não só tem capacidade de ir como vai bem longe - disse Noca, pouco antes do discurso do governador eleito do Rio, Sérgio Cabral (PMDB).

Cabral, diante das lideranças do movimento negro que estavam presentes, prometeu lutar contra as desigualdades entre brancos e negros em seu mandato no Palácio Guanabara.

- Não quero que policiais parem negros para revistá-los apenas pela cor da pele ou que porteiros olhem para uma pessoa negra e abram as entradas de serviço - diz Cabral.

A advogada Marlene Mendes, 62 anos, apesar de ter sido vítima de discriminação profissional por causa da cor da pele, faz questão de demonstrar seu orgulho em ser negra.

- Sou auditora fiscal aposentada e, alguns colegas de trabalho, me perguntavam quem era meu padrinho por não acreditarem na capacidade de uma negra alcançar, sozinha, um cargo desta relevância - relembra a advogada, que reagia ao preconceito com bom humor. - Eu, que tenho e sempre tive orgulho de ser negra e passei esse sentimento para minha filha, apontava para o céu e dizia que o meu padrinho era Deus.

Marlene, hoje integrante de ONGs em defesa da cultura e da pessoa negra, lamenta que o negro ainda não tenha plena consciência de seu valor.

- Eventos como o de hoje (ontem), que preservam um dos poucos ícones negros existentes, aumentam, sem dúvida alguma, a auto-estima de seu povo - conclui Marlene, que levou integrantes de uma igreja messiânica, todos brancos, para rezar para uma das lendas negras brasileiras.

A coordenadora de Relações Internacionais e Comércio Exterior Tatiana Zanon, 26 anos, também apoia o Dia da Consciência Negra.

- Apesar de ser branca, não esqueço que o sangue negro está no sangue dos brasileiros em geral e, em especial, na minha família - conta Tatiana. - Por isso sou completamente a favor do negro resgatar seus valores, assim como os índios.

Lideranças indígenas, convidadas a participar do evento, lembraram que antes de um homem ser índio ou negro, é um ser humano.

- E todo ser humano merece todo o respeito - disseram.

JB Online, 21.11.2006
http://jbonline.terra.com.br/
editorias/rio/papel/2006/11/21/rio20061121002.html

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